
Subi as escadas vertebrais do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro tropeçando, meu açucar estava baixo e eu começava a não saber onde estava. Subi o segundo lance de escadas e cheguei ao último andar. Foi quando vi escrito « Cristina Canale - arredores e traços ». Olhei ao meu redor, e vi cores, um mar de cores. Então, meus olhos bateram na frase « Não é tanto um exercício de precisão da linha, mas de contenção e expansão de uma energia cromática. » do curador Luiz Camillo Osorio.
Exposição : Cristina Canale - arredores e rastros
Curadoria : Luiz Camillo Osorio
Local : Museu de Arte Moderna Rio de Janeiro
Resolvi descer as escadas, eu precisava refazer-me. Suprir meu corpo para depois alimentar a alma. Sentei no jardim do museu, pessoas treinavam lutas marciais, outras tocavam música, alguns caminhavam e eu comia um muffin de tomate feito por mim. Fiquei ali vendo o movimento, as palmeiras, a água e a vida. Eu adoro o concreto do museu.
E voltei, pousei meus pés sobre o chão cinza e subi novamente todas aquelas escadas sem fim deparando-me com « Lisérgico », 2002, acrílica, óleo e bastão oleoso sobre tela, técnica muito utilizada pela artista. E balbuciei baixinho « UAU ». Suas cores pulsam em movimentos alucinados e alucinantes. Os quadros são lúdicos, têm uma infantilidade madura, a mesma que sinto em minha mãe.
Gosto da metalinguagem que vi em « Casa da Esquina II » de 2005, quando vi o canto do quadro sem tinta deixando nua, a tela. Nada tem modulação, é um mundo quase sem profundidade, como se a vida estivesse toda rasa, toda à mostra, assim, tão acessível a quem quiser sentí-la e vê-la.
« Mãe e filha II » de 2007, este sou eu e a mamãe no Jardim Botânico. Elas são uma só, mudas e cegas por algum mal que as aflige. Uma protege a outra com a verdade do branco, cor tão usada pela artista e jamais temida. Grandes áreas brancas. Canale me traz coisas boas com suas cores suaves e pontos de potência. É sublime.
« Sangue frio » 1994, acrílica e óleo sobre tela pode ter o título pesado mas não possui estética de asco. Eu faria uma coleção de saias com este quadro. Mulheres suaves e calmas vestindo formas românticas, algo como New Look. Entretanto, de perto, mulheres frias e más. Não más pois matarão, mas porque roubarão seu coração sem pedir permissão e o enterrarão no quintal. E sem culpa. As blusas seriam de « Platane » 1995, óleo sobre tela.
« La chair est triste » 2010, acrílica, óleo e bastão oleoso sobre tela, faz berrar texturas, eu poderia ficar o dia todo olhando esta poltrona amarela. É viva, é positiva.
Eu quero me vestir de Canale e mergulhar em sua tinta, brincar com seus pincéis, ser a pequena « Columbina » 2006. Sair dançando por aí de saia verde-agua, convidada pelo azul profundo fluindo do fundo. E a música fica por conta do vermelho nos sapatinhos e no laranja-avermelhado na pedra, é o jazz, é o azul do blues. Meus pés seguiam o ritmo, meu sangue sentiu o cinza. A sala ficou cheia de ar…
Eu pagaria o que fosse para ter uma camisa com estampa de « Olhando para o Futuro » 2003. Eu quero pular, brincar, é o céu, é o céu ! Sentei no banco bem em frente ao quadro e fiquei. Não queria ir embora, eu poderia dormir aquela noite ali, ficaria com os olhos presos, entretidos, sedados por tantas cores lindas. E a menininha olhava o futuro, e eu ali bem na frente dela. Lembrei de quando eu sonhava acordada no meu quarto azul de cal, imaginando como eu seria quando mulher. O futuro será sempre futuro e eu permanecerei sonhando acordada esperando o fecundo futuro chegar ao sonho sempiterno para me tornar mulher.
Fiquei ali mais um tempo, locupletando-me vagarosamente do máximo que pudesse de Canale.
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