
Eu fecho os olhos e vejo alguns frames de uma animação covarde. Eu estava em frente ao MASP quando vi um homem tropeçar na calçada e cair lentamente de cara no chão. Como em “Irreversível” de Gaspar Noé, eu pude ver aquela cara velha do homem se amassando ao tocar o chão. Seu crânio voltou a bater novamente. Foi como me senti em Paris: totalmente inútil, obsoleta. São os olhos, a culpa é dos olhos que enfiam em mim toda aquela culpa, ainda verei muitos olhos pedindo minha ajuda e eu poderei apenas dar-lhes o meu flash. Sinto necessidade de ser mais humana. Estou cansada não sei do quê. Acho que desse total estado de vegetação mental. Me gustan los desafios, y a ti? Le gustan? Lábios tão doces, aqueles olhos tão negros. Confundo tudo quando fecho os olhos e não sei mais lembrar do teu rosto. Apenas sinto seu cheiro. Não vejo nada. Não quero ver. Você me fala de filmes e de fotógrafos. Eu não quero te entender. Vivo. Olho para esse anel azul no meu dedo e lembro de festivais de filme nos quais nunca estive, sinto aromas. Ele caiu. Do seu nariz jorrava um sangue falso, a luz era cinza como em Londres, estava frio. E eu, eu não sabia o que fazer então, olhei seus olhos negros. Não foi um homem que caiu na minha frente, foram minhas ilusões que acordaram com aquele impacto. Trazia-me realidade, esta que eu não queria ter consciência. Meu ovário direito me faz lembrar que sou humana. Ele dói. Tão simplesmente vivo. E entendi toda a situação, pela minha cabeça passam milhões de coisas menos que nosso amor é verdadeiro.
É incrível como me apontam e dizem na minha cara quem sou. É mesmo? Nem mesmo eu sei quem eu sou. Queria ver um filme agora. Um filme que contasse a história de uma garota americana que viaja pela Europa. Deixe-me contar sua historinha.
Ela comprou um vinho barato e resolveu bebê-lo na pseudo-praia daquela ilha francesa no meio de Paris. Ela tinha sido absorvida por aqueles olhos que a seguiam e pedia explicações de todos seus atos. Que imagens atrozes! Ela olha ao longe e vê pessoas comendo suas baguetes e vendo os barcos passarem. A luz é rósea e alaranjada. Ela adora aquela solidão marota, pessoas a olham com descaso. Ela sente pena de todos. Na verdade, ela não sente nada. Ela pedi amigos. E dois garotos franceses lhe ofereceram batatinhas. Seguiram juntos para um passeio pelas ruas parisienses que pertencem a somente eles. Comeram crepes e riram. Ela sentiu-se excluída por não falar francês. Ele a olhou e ficou tudo bem, afinal quem se importa? Não precisavam falar para entenderem-se. Bastava olhar. Aqueles olhos negros. Ele ia à frente, desceram as escadas de alguma ponte. Ela disse “Au revoir” e ele logo gelou. Ela não poderia ir-se assim. Ele subiu as escadas correndo e perguntou para ela em francês se ela gostaria que ele a acompanhasse até o albergue, ela respondeu em inglês que gostaria muito. E andaram, ela guiando os dois.
Em uma rua estreita eles se beijaram, garotas passavam e olhavam com vontade. Todos querem amar na capital d´amour. Ele vai embora. E a história acaba assim. A vida é assim: simples. Sem fogos de artifício, sem amores ideais, sem. Eu poderia mudar o fim e dizer que ele a matou, ou que eles se reencontraram e casaram e depois brigaram. Amores possíveis. Porém, não, acabou assim sem nada demais. A vida é dura, meu amor. Bombeiros me olhavam com rancor. Eu sentia prazer ao ver todo aquele sangue misturado com água e gasolina. O limiar é fino, quebradiço. Eu não queria ter princípios nem mesmo ética. Ética? Qual a estética da ética? E fim.
Hoje tudo terminou seco e sem respostas. A vida é assim. Não existem finais de novela das oito nem mesmo making-of. Tudo que mais sinto falta são as coisas que não posso tocar. A realidade intangível toma conta de meus pensamentos.
adorei o post.. lindo.. lindo..
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