
Venice, Venezia, Veneza são meus três amores. O mesmo lugar que possui faces tão diferentes. Depois de ter atravessado o Grande Canal com aquela mochila enorme, um skate e um violão, eu chegara ao meu albergue. No caminho esbarrei com dois garotos de algum país que conta com um exercito de oxigenados sarados e preparados para envenenar todas as mocinhas solteiras e desavisadas. Nem dei bola, o cansaço conseguiu acalmar-me. Observei e tentei compreender o porquê daquele lugar ser tão citado, o porquê daquelas pedras e águas deixarem tantos a beira da loucura.
Mais que Paris ali jazia um amor puro e cheio do sofrimento romântico vivido pelos humanistas, renascentistas, Manets e todos os que tiveram coragem de expor em suas artes toda sua emoção. As cores eram intensas, o cheiro era bom. Incrivelmente bom. Via crianças falando em espanhol sobre jogadores brasileiros de futebol, via casais jovens sentados na escada, via senhoras comprando lembrancinhas para seus netinhos que provavelmente estão bêbados em algum programa de trabalho universitário.
Desde quando inventaram o cartão de crédito, inventaram também a distância do jovem com seus pais. Não precisa mais pedir autorização, não precisa explicar os motivos. Apenas precisa fazer certo drama quando a fatura chega. Este ciclo não é saudável para nenhuma das partes. Ambos ficam sós, je suis desolé parce que je peux faire beaucoup de chose avec tout les hommes. C´est vrai. É aquela felicidade que não se completa, aquele sorriso sem motivo, olhar vazio. Às vezes não quero dizer a verdade.
Perdi-me inúmeras vezes por aquelas ruas estreitas, elas abrigam-nos e congela-nos quando percebemos por mais gostoso ser o jogo, não achamos o final. Um emaranhado de mascaras, a cor da água é algo de um espelho embaçado com a cor dos olhos da pessoa na qual não sonho mais. Não me senti só nem mesmo por um segundo. Presenteei-me com pecinhas de vidro. “O anel que tu me destes, era vidro e se quebrou”. Quis dançar por entres as pessoas.
Voltei tarde da noite, todos ainda tinham fôlego, eu tinha carência. Não sabia do quê. Organizei-me para relaxar. O objetivo final da noite. Se existe preconceitos em vossos corações, por favor, interromper a leitura. Agora, eu assim, com meus 36 anos já não me preocupo com impressões alheias. Estóicos abrem-me os olhos.
Amsterdã ainda estava no meu tênis enchulerado. Peguei meu violão, o sanduíche comprado perto do canal e meu baseado. Comi. Senti. Mastiguei os pedacinhos de pão olhando para aquelas águas, com os pés soltos à beira da calçada daquelas ruas de rio. Andei em direção a algum lugar que pudesse “fazer fumaça”. Senti as pessoas olhando-me, fiquei com medo das sombras, latidos, vozes. Sai andando para qualquer lugar, subi uma ponte e vi um casal sentado no chão trocando beijos, carinhos. Ele abraçava-a com tanto esmero, protegia-a. Eu fiquei paralisada, senti em meu peito uma vontade atroz de ter para mim também aquelas sensações traiçoeiras e efêmeras. Apegar-me-ia tão justamente sem consciência e sem querer libertar-me. Na verdade estava só. Pensei sobre o garoto de Milão. Mentira. Pensei sobre o homem de Paris. O mesmo de Barcelona. De Londres. De Franca. De noites em claro pensando e sonhando turista na mobília certa para casa de campo na Gallerie Lafayette.
Resolvi voltar para perto das pessoas. O vazio provoca medo tanto quanto a multidão. Olhei para o chão e vi um cigarro fino, diferente e quase no final. Abaixei e capturei aquela sobra. Descasquei-o como a uma banana, porém não tinha fim. Decidi fuma-lo. Com mãos tremulas peguei o isqueiro e acendi aquelas nuances dos lábios que alguém deixara abandonado naquela ruela veneziana. A cena era de cinema: eu ali parada com pose de gala 007, sentindo-me refinadissima.
Cansei de fazer fita. Sentei novamente a beira do rio, desembainhei meu violão e senti o vento beijar suave meu rosto, às vezes barcos passavam, às vezes pessoas riam. Toquei, cantei apenas musica brasileira. Minha alma estava verde e amarela completamente. O único país que meu peito pedia era o Brasil. Aquele com z ou com s. Não importava. Circulei entre cazuzas e caetanos. Imaginei-me com vanessas da mata e respirei o ar carioca. Pensei